A música como ferramenta de catarse e transformação. É assim que MERAI se empodera e apodera da canção “O Meu Corpo Não”, uma faixa intensa que transforma a violência sexual em um grito libertário. A composição, que chega com um clipe performático e cheio de simbolismos, mostra a força da voz da artista portuguesa, que desponta no cenário europeu.
“A história de O Meu Corpo Não é uma de sororidade entre mulheres, e uma morte ao macho tóxico que permite e normaliza estas práticas em sociedade. A canção leva-nos pelo processo da vítima: da desconfiança, ao desespero, à dor, passando pela raiva e terminando na vingança”, relata MERAI. “A batalha é nada mais que lutar por um presente e um futuro em que o corpo da mulher não é visto como um baldio (um terreno que é usado coletivamente), pois o corpo da mulher é dela”.
Com ascendência angolana, MERAI é natural de Lisboa e, com apenas 23 anos, é uma artista multifacetada, cuja jornada é marcada por uma ampla gama de influências e paixões. Desde a infância, ela se envolveu com a música, estudando Música Clássica e posteriormente se formando em Línguas Literaturas e Culturas na Universidade de Lisboa, além de concluir um curso em Produção Musical. Essa base sólida em diferentes disciplinas se reflete na sua música, que abraça elementos do afropop, hip hop, música coral, música eletrônica e até elementos tradicionais portugueses.
A sonoridade é sombria, repleta de ruídos que capturam a ansiedade da vítima e um ritmo constante que evoca um campo de batalha. Os gritos no refrão ecoam dor e revolta. E isso é demonstrado em seu vídeo. Repleto de simbolismo, o material dirigido pela própria artista destaca a sororidade entre mulheres e desafia a toxicidade masculina.
“O vídeo mergulha-nos ainda mais fundo nesta narrativa pois está repleto de simbolismo. O homem com a bicicleta que circunda as mulheres simboliza os círculos que o predador faz à volta das suas presas. A mulher que dá de comer a malagueta ao homem é uma encenação da maçã que Eva dá de comer a Adão, só que a malagueta é picante, ou seja perigosa – uma lembrança para não subestimar a mulher. As máscaras que são usadas ao longo do vídeo permitem simbolizar este jogo de forças que há entre o Divino Feminino e a Masculinidade Tóxica, muito para além da dimensão humana. É o Divino Feminino que se revolta e exige justiça”, ela revela.
MERAI traz em sua obra uma maturidade conceitual de alguém com muito a mostrar para o público. O lançamento do EP “Fénix” este ano demonstrou sua habilidade em explorar temas complexos, com foco na vida e na morte. Em agosto, ela lançou “Deixa-te Levar”, uma canção de verão totalmente produzida e tocada por ela. Além disso, MERAI tem se apresentado em várias salas de concerto em Portugal e participou de eventos culturais de grande importância, incluindo a Marcha Feminista de 8 de Março de 2023.
No entanto, é com “O Meu Corpo Não” que MERAI faz seu trabalho mais ousado e mergulha profundamente em um tema sensível e urgente: a violência sexual. A canção narra a jornada de uma vítima, desde a desconfiança até a vingança, oferecendo uma visão poderosa e dolorosa dessa realidade. Com versos como “O meu corpo é um baldio / E tu queres-te aproveitar”, MERAI confronta diretamente o tema da violência sexual e sua negação.
“O Meu Corpo Não” não é apenas uma canção, é um manifesto. MERAI usa sua arte como um veículo para enfrentar questões difíceis e provocar reflexão na sociedade. Sua música é um lembrete poderoso de que o corpo da mulher pertence a ela e que a violência sexual não pode ser tolerada.